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quinta-feira, 1 de novembro de 2012

BC japonês aposta em mais liquidez


Confirmando as expectativas, o Banco do Japão (BoJ) injetou mais liquidez na economia, embora tenha mantido o horizonte de atuação até dezembro de 2013, um trimestre antes do fim do ano fiscal. O volume total do programa de compras de ativos (APP, na sigla em inglês) foi ampliado em 10,91 trilhões de ienes, totalizando 91,13 trilhões de ienes. Foi a terceira expansão desde a criação do programa de 65 trilhões de ienes em fevereiro, sendo que as duas últimas foram consecutivas (havia sido ampliado para 80 trilhões de ienes em setembro), algo que não se via desde maio de 2003.

Desses quase 11 trilhões de ienes (equivalentes a US$ 138 bilhões), 5 trilhões de ienes serão usados para compras de títulos soberanos (JGBs) e outros 5 trilhões de ienes para títulos de curto prazo (T-Bills). Adicionalmente serão comprados do setor privado 100 bilhões de ienes de commercial papers, 300 bilhões de ienes em bônus corporativos, 500 bilhões de ienes em ETFs (fundos de índice) e 10 bilhões de ienes em REITs (títulos imobiliários). O APP terá a seguinte divisão: 58,5 trilhões de ienes (64,3%) em títulos públicos; 7,63 trilhões de ienes (8,3%) em ativos privados; e 25 trilhões de ienes (27,4%) em operações de liquidez contra garantias.

Os motivos para a ação do BoJ não são novidade. Por um lado, a desaceleração da economia depois da "esticada" do PIB com a reconstrução pós-tsunami e os subsídios para compra de carros de energia limpa. E, por outro, a persistente deflação, que se intensificou nos últimos quatro meses. O núcleo da inflação está em território deflacionário há 46 meses.

As projeções do BoJ para a economia, divulgadas ontem no relatório semestral "The Bank"s View", estão mais pessimistas que em julho, data do último documento. A expectativa de crescimento no ano fiscal de 2012 foi reduzida de 2,2% a 1,5%, e em 2013, de 1,7% a 1,6%. Do lado dos preços, as previsões também indicam piora. A deflação em 2012, anteriormente projetada em 0,2%, deve ser de 1,1%. Para o ano fiscal 2013, o cenário é mais ameno, com inflação de 0,5% contra 0,6% anteriormente projetado.

Já para 2014, o BoJ prevê uma forte recuperação econômica mundial, o que elevaria os preços internacionais das commodities e revigoraria a demanda externa. Com isso, a inflação deve saltar para 1,3%, excluindo os efeitos da elevação do imposto sobre o consumo (equivalente ao IVA), previsto para abril de 2014. Agregando tais impactos, a inflação poderia atingir 4,2% segundo modelos do BC. Não parece factível atualmente.

A questão é quão eficiente é o pacote de compras de ativos para "reanimar os preços" nos próximos dois anos. A meta de inflação de 1% criada em fevereiro juntamente com o APP mostrou que o governo deseja ser mais efetivo no combate à espiral deflacionária que ronda o país desde a década de 1990, quando do estouro da bolha de ativos. Desse período até hoje, uma rápida análise entre a expansão do balanço do banco central, da oferta de moeda e do CPI mostra pouca (ou nenhuma) correlação entre tais expansões e a inflação.

O BoJ também anunciou a criação de uma linha de crédito especial ilimitada ("Stimulating Bank Lending Facility") para estimular os empréstimos bancários, na qual irá fornecer recursos para até quatro prazos a taxas de juro do overnight (0% a 0,1%). Entretanto, o custo real de empréstimos, considerando a deflação, pode tornar pouco atrativa essa operação vis-à-vis outros tipos em mercados internacionais. Algo para ser acompanhado.

Quanto ao crescimento, o BoJ explica que o corte nas projeções de crescimento deve-se à deterioração do cenário externo, o que adiou a recuperação da economia japonesa. Com a demanda externa desaquecida, as exportações e a produção industrial devem permanecer fracas na segunda metade do ano fiscal de 2012 e em 2013, como já está muito claro nos indicadores. A produção mostrou, em setembro, queda dessazonalizada de 4,1%, a terceira consecutiva, em dados divulgados ontem. A balança comercial mostra recorde histórico de 3,2 trilhões de ienes em déficit no primeiro semestre do ano fiscal japonês (abril a setembro).

Não à toa, o governo japonês aprovou em 26 de outubro um pacote de estímulo econômico voltado à infraestrutura (especialmente em regiões abaladas pelo tsunami) da ordem de até 422,6 bilhões de ienes (algo como US$ 5,3 bilhões). Os recursos virão de um fundo emergencial do governo, não da emissão de dívida.

O país, aliás, enfrenta outro desafio no meio desse ambiente: evitar um "fiscal cliff" (abismo fiscal) até novembro. Trata-se da aprovação do aumento de recursos (emissão de títulos) para financiar a dívida pública que sempre foi técnica, automática. O orçamento prevê despesas de 90,3 trilhões de ienes, dos quais, 38,3 trilhões via emissão de dívida.

Imbróglios políticos entre o partido do primeiro-ministro Yoshihiko Noda (DPJ) e a oposição (LDP) paralisaram as votações. A oposição exige que seja cumprida a promessa de dissolver o Parlamento e convocar uma eleição geral antecipada.

A emissão de títulos públicos cobrirá cerca de 40% do orçamento até o fim do ano fiscal. Os demais 60% serão financiados por impostos e outras receitas. Diante do bloqueio da oposição, as despesas correntes e, principalmente, o repasse de recursos para as regiões tiveram que ser adiados. A situação tende a piorar na permanência desse impasse político. O governo só tem recursos até o mês de novembro. A dívida bruta do Japão atinge hoje 240% do PIB.

Fonte: Valor