Acuado pela atabalhoada reação do governo ao terremoto e ao tsunami de março, e ao subsequente acidente nuclear, o primeiro-ministro do Japão, Naoto Kan, deve renunciar hoje. A sucessão ocorre em meio a uma situação econômica incerta no país. A produção se recupera lentamente das catástrofes de março, a valorização da moeda, o iene, tira competitividade das exportações e o país ainda enfrenta uma crise energética, por conta da paralisação de vários usinas nucleares.
Com a renúncia de Kan, o seu partido, o Democrata (PD), realiza na segunda-feira eleição interna para escolher um novo líder. Como detém a maioria na Câmara Baixa, o PD definirá o próximo premiê. Os principais candidatos à sucessão de Kan são o ministro das Finanças, Yoshihiko Noda, 54, o ministro do Comércio, Banri Kaieda, 62, o ministro da Agricultura, Michihiko Kano, 69, e o ex-ministro do Exterior Seiji Maehara, 49.
O novo primeiro-ministro herdará uma economia em contração há três trimestres consecutivos, a maior dívida pública do mundo (943,8 trilhões de ienes, aproximadamente R$ 19,6 trilhões) e uma moeda em seu ponto de maior valorização desde a Segunda Guerra Mundial, o que é um obstáculo às exportações. Terá ainda que lidar com um partido dividido quanto à opção de aumentar os impostos para controlar a dívida e financiar a reconstrução. O governo de Kan estabeleceu planos de gastar 19 trilhões de ienes ao longo dos próximos cinco anos para recuperar as áreas atingidas pelo terremoto e tsunami que mataram cerca de 20 mil pessoas e desalojaram 80 mil.
"O próximo líder provavelmente não terá coragem para aumentar impostos para financiar a reconstrução porque estará mais preocupado com a perda de popularidade do que com a situação fiscal do Japão", disse Hiromichi Shirakawa, economista-chefe para o Japão no Credit Suisse em Tóquio. "Não há nada que sugira que estamos no caminho certo para atingir a saúde fiscal."
O futuro premiê também precisará definir a nova política energética do país, já que após o acidente em Fukushima o governo definiu que o Japão irá abandonar gradativamente a alternativa nuclear, encerrando as operações de todos os 54 reatores.
O PD vem perdendo prestígio junto aos eleitores desde que, em agosto de 2009, terminou com um domínio de 50 anos quase ininterruptos do Partido Liberal Democrático (PLD). O PD não conseguiu cumprir a promessa de tirar o país de duas décadas de estagnação econômica e repetiu o padrão do PLD de trocas constantes da liderança. Com o sucessor de Kan, o Japão chegará ao sexto premiê num espaço de cinco anos. Em 2009, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva brincou com a situação, dizendo que "o Japão muda tanto de primeiro-ministro que a gente dá bom-dia para um e boa-noite para outro".
Anteontem, a empresa de avaliação de risco Moody's rebaixou a classificação dos títulos japoneses para AA3. Segundo a Moody's, a decisão foi tomada porque a instabilidade política "impede o governo de transformar estratégias econômicas e fiscais de longo prazo em políticas eficazes e duradouras".