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quinta-feira, 18 de julho de 2013

G-20 se pergunta: e se o Japão não crescer?

O FMI destacou-os em seu último relatório como os três maiores riscos para a economia mundial atualmente, e eles serão tema da reunião deste fim de semana do G-20, em Moscou: 1. A saída nos EUA do estímulo monetário, que vem mexendo com os mercados há dois meses; 2. A desaceleração na China, especialmente depois que o ministro das Finanças chinês falou em crescimento abaixo de 7%; 3. E o Japão. Japão? O que tem o Japão?

O Japão está fazendo uma das mais arriscadas manobras de política econômica dos últimos tempos. Se der certo, pode recolocar o país no rumo de crescimento, depois de 20 anos de estagnação, e encerrar um prolongado período de deflação.

Mas e se der errado? Nas palavras de um sherpa do G-20 (aqueles diplomatas que preparam tudo para os líderes assinarem): se não der certo, "o Japão pode quebrar, com um impacto muito forte para a Ásia e para o mundo". Esse negociador, de um país rico, pediu para não ser identificado.

O programa japonês já tem um nome consagrado: é a chamada Abenomics, numa referência à política econômica introduzida pelo governo do novo primeiro-ministro, Shinzo Abe, que assumiu o cargo em dezembro do ano passado.

O plano de Abe se baseia num tripé: políticas monetária e fiscal expansionistas e reformas estruturais para favorecer os investimentos. Por enquanto, houve muito expansionismo monetário e fiscal e poucas reformas. Mas isso pode mudar com as eleições deste domingo, quando o partido de Abe deve recuperar a maioria no Senado.

Em abril, já sob a direção de Haruhiko Kuroda, o Banco do Japão (o BC japonês) começou o agressivo programa de afrouxamento monetário, dobrando (para US$ 70 bilhões por mês) a compra de títulos do governo que estavam com o sistema financeiro. O objetivo é irrigar o mercado e estimular a concessão de crédito. O governo ampliou ainda o já elevado gasto público (o déficit fiscal este ano deve chegar a 10,5% do PIB) para manter aquecida a economia.

Como resultado, o iene despencou 21% em relação ao dólar nos últimos 12 meses, o que favorece as exportações japonesas, para irritação dos parceiros comerciais, em especial de concorrentes próximos, como a Coreia do Sul e a China.

Se não crescer, Japão pode quebrar, com um forte impacto global

O BC espera que essa combinação comece a elevar os preços ao consumidor para a meta de 2% ao ano. Em maio (último dado disponível), o preços ficaram estáveis, após sete meses seguidos de deflação.

A Abenomics divide economistas. O Prêmio Nobel Paul Krugman elogiou o plano, comparando-o ao programa de estímulo fiscal do Fed, nos EUA, e criticou as autoridades japonesas por terem demorado a agir.

Já o economista americano Martin Feldstein criticou o plano e previu (em artigo publicado pelo Valor em 21/01) que, ao elevar o déficit e a dívida, ele vai minar a confiança no país e provocar um aumento das taxas de juros de longo prazo. Isso é perigoso pois a dívida japonesa é a maior entre as principais economias, em 245% do PIB. A Grécia, tão castigada pelos mercados financeiros, têm dívida de 179% do PIB. Os EUA, de 109%.

Se a conta de juros do Japão subir muito, pode ameaçar a solvência do país e levar a uma reestruturação da dívida.

Ainda não há um resultado claro da Abenomics. O PIB do segundo trimestre deve crescer 2,8%. As exportações subiram, mas voltaram a cair, apesar do iene fraco (veja gráfico). A bolsa disparou, mas as empresas não parecem confiantes o bastante para voltar a investir.

As taxas de juros de longo prazo subiram desde abril, mas economistas alegam que isso ocorreu devido à perspectiva de fim do estímulo fiscal nos EUA, fator que o Japão não controla.

Há outros ventos contrários. O país vive uma crise energética desde o fechamento das usinas nucleares, após o acidente de Fukushima, em 2011. Isso elevou o preço da energia e desestimula investimento e produção. Muitos economistas destacam ainda a dinâmica demográfica negativa, com queda da população e alta do número de idosos, o que tende a pesar sobre a produção, o consumo e a elevar o gasto público. Uma em cada quatro pessoas no Japão terá mais de 65 anos em 2014, contra só 9,6% na China e 14,2% nos EUA, segundo dados do Censo americano.

A chance de sucesso da Abenomics dependerá ainda de se os japoneses continuarão gastando mesmo depois do aumento do imposto sobre consumo, que subirá de 5% para 8% em 2014. Na última vez em que o imposto foi elevado, em 1997, houve forte retração do consumo, que jogou o país numa recessão. Essa alta pode ser adiada por Abe, após as eleições, mas nesse caso ele dificilmente conseguirá manter a promessa de reduzir o déficit público.

"Se o Japão conseguir crescer, a receita fiscal vai subir e a relação dívida/PIB vai cair, iniciando um círculo virtuoso. Mas, se não crescer, o Japão pode quebrar, com um impacto muito forte para a Ásia e para o mundo. Por isso, há muita ansiedade com relação ao programa de estímulo japonês", disse o sherpa do G-20. Essa ansiedade não será expressa em público pelo grupo, para evitar aumentar a desconfiança em relação à aposta japonesa.

Fonte: Valor
Conluna assinada por: Humberto Saccomandi